quarta-feira, 28 de novembro de 2007

Erradicar a Pobreza e a Exclusão Social

Mensagem da REAPN relativamente ao Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza

A Rede Europeia Anti Pobreza / Portugal - REAPN representa em Portugal a European Anti Poverty Network (EAPN), desde a sua fundação, em 1990. A EAPN é uma associação sem fins lucrativos (ASBL), sediada em Bruxelas, estando representada em cada um dos Estado - Membro da U.E. por Redes Nacionais.

A REAPN é uma entidade sem fins lucrativos, reconhecida como Associação de Solidariedade Social, de âmbito nacional, tendo sido constituída notoriamente a 17 de Dezembro de 1991. Em 1995, é reconhecida, pelo Instituto de Cooperação Portuguesa, como Organização Não Governamental para o Desenvolvimento (ONGD).

A REAP tem um blogue no endereço http://reapn-imprensa.blogspot.com.

A erradicação da pobreza e da exclusão social é indiscutivelmente um dos principais desafios do desenvolvimento e dos direitos humanos do nosso século, havendo uma consciencialização crescente que é imperioso conciliar o desenvolvimento económico com a coesão e justiça social.

A dimensão e a complexidade destes fenómenos estão bem patentes nos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio definidos pela ONU em 2000, onde se define como meta a redução da pobreza extrema para metade até 2015. Também em 2000, a União Europeia, a partir da Cimeira de Lisboa, retomou estes temas como uma preocupação central da construção europeia, colocando o objectivo da coesão social ao mesmo nível do crescimento económico e do emprego.

Embora os resultados alcançados, até ao momento, tenham ficado muito aquém das expectativas, a verdade é que não podemos esquecer que o caminho a percorrer é longo e implica concertação de meios e vontades. Mas, o facto de estes mesmos temas e preocupações voltarem novamente para o centro das agendas políticas nacionais e internacionais significa que a prioridade se mantém e que envolve toda a sociedade.

À semelhança dos anos anteriores, a REAPN procura assinalar o Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza, através de acções diversificadas, descentralizadas e que espelham o carácter multifacetado da pobreza e da exclusão social. Acções que pretendem, acima de tudo, alertar as consciências para este problema que afecta uma faixa considerável da população portuguesa.

Portugal detém a condição de país mais desigual na UE e de portador de maior índice de pobreza relativa, com um valor que há anos estabilizou nos 20/21 por cento, o que se traduz em 2 milhões de portugueses a viver em situação de pobreza. Portugal destaca-se ainda, pela pior posição quando se fala de pobreza persistente. Em Portugal trabalhar não tende a assegurar a cobertura do risco de pobreza. Cerca de 12% dos trabalhadores são pobres. Apesar da taxa de desemprego ser inferior à média europeia, é superior aos valores médios da última década. A Região Norte tornou-se líder no desemprego, 46% dos desempregados concentram-se nesta região. A esta situação não é alheia o número crescente de empresas que têm vindo a encerrar, devido a vários factores, nomeadamente à deslocalização para países onde a mão de obra é mais barata.

Outros sinais da má situação em que se encontra o nosso país são a descida de 26º para 27º na última lista ordenada do desenvolvimento humano da ONU, uma das maiores percentagens de crianças pobres, 27% das crianças encontra-se em risco de pobreza e a pior taxa de abandono escolar, 41,1% em 2005, mais do dobro da média comunitária.

No contexto europeu este cenário é também bastante perturbador, com cerca de 72 milhões de pessoas em risco de pobreza. A nível mundial o número de pobres já chega a 307 milhões, onde 1 em cada 5 pessoas vive com menos de 1 dólar por dia.

Os números citados dizem respeito a pessoas reais: idosos, crianças, deficientes, mulheres, nomeadamente, vítimas de violência ou de tráfico, imigrantes, minorias étnicas e requerentes de asilo, entre muitos outros. Reflectem ainda realidades dramáticas como a fome, a subnutrição, as doenças com especial enfoque para a malária, a Sida, a tuberculose, a toxicodependência, etc. Estes fenómenos, de verdadeira pobreza extrema constituem, em nosso entender, uma negação dos direitos humanos fundamentais. A resolução deste problema deve ser assumida com a mesma determinação com que em tempos se combateu a escravatura!

Assim, consideramos de toda a importância definir uma estratégia nacional, que se paute pelos mesmos princípios de acção da estratégia definida a nível europeu e mundial.

Em nosso entender essa estratégia deve passar pelos seguintes princípios de acção:

1) Comprometimento/empenhamento da sociedade civil e do poder político
Consideramos prioritário que a sociedade portuguesa, nas diversas instâncias que a compõem, se consciencialize de que o problema da pobreza e da exclusão social é algo que diz respeito a todos e que exige um comprometimento generalizado dos vários sectores da sociedade. Importa garantir, do ponto de vista do governo nacional, uma apropriação por parte dos diferentes ministérios, do novo Plano Nacional de Acção para a Inclusão 2006-2008. Os primeiros esforços de mainstreaming da inclusão social estão contemplados neste Plano, onde é proposta a criação de novas estruturas institucionais em cada ministério, designadas de “pontos focais”. Podemos perceber esses mesmos esforços, também, pela possibilidade de podermos contar com a existência formal de um

Fórum Não Governamental para a Inclusão Social (FNGIS), que funciona como uma plataforma de interlocução do sector não governamental ao nível do PNAI.

2) Apostar numa abordagem abrangente, na qual os três pilares inerentes à Estratégia de Lisboa sejam operacionalizados no contexto nacional: o crescimento, o emprego e a coesão social.

A chamada Estratégia de Lisboa renovada surge em 2005, em nosso entender, como um claro retrocesso, colocando o pilar da inclusão social em segundo plano em relação aos outros dois. Consideramos fundamental que o Governo Nacional contrarie esta tendência europeia e assuma, no segundo semestre de 2007, a presidência da União Europeia com um propósito explícito de redimensionar a coesão social, assegurando um progresso equilibrado nas 3 vertentes. Conscientes que os progressos ao nível da inclusão social precisam de evoluir de forma a provocar um decisivo impacto na erradicação da Pobreza até 2010, consideramos que a Presidência Portuguesa deve traçar um novo rumo, produzindo um ponto de inflexão na agenda europeia.

3) Importa garantir que se estabeleçam objectivos ambiciosos no domínio da luta contra a pobreza e a exclusão social e que se aposte numa coordenação das políticas, tendo como horizonte temporal o ano de 2010 - Ano Europeu de luta contra a Pobreza e a Exclusão Social.
Neste sentido, é fundamental que no contexto nacional sejam criados mecanismos (indicadores) que permitam avaliar o impacto das diferentes medidas de política accionadas pelos diferentes ministérios em termos da produção/reprodução da pobreza e exclusão social (poverty proofing).

4) Participação e mobilização de todos os actores.
A luta contra a pobreza e a exclusão social deve ser assumida a nível nacional, regional e local, bem como pela sociedade civil. Quando falamos na mobilização de todos os actores falamos também, e sobretudo, nas pessoas que experienciam situações de pobreza e exclusão social e das organizações que directamente as representam. Há por isso que criar condições/mecanismos que permitam a participação daqueles que mais têm a dizer sobre a sua própria situação.

5) Descentralização da luta contra a pobreza e exclusão social.
A REAPN considera de toda a utilidade e eficácia o desenho de planos de acção territorializados, que potenciem as sinergias e os recursos locais, numa lógica de trabalho em rede e de corresponsabilização dos diferentes actores.

6) Direito a um rendimento mínimo e a uma protecção social adequada.
A Carta Social Europeia diz que o salário mínimo nacional deve ser 60 por cento da média ponderada das remunerações do país, o que em Portugal corresponde a 580 euros por mês. Assim, o salário mínimo nacional está cinco por cento abaixo da recomendação da União Europeia, ou seja, menos 21 euros e 36 cêntimos.

O conceito de “flexi-segurança” começa a fazer eco junto das instâncias decisoras e dos parceiros sociais, tanto a nível europeu como nacional. Em nosso entender terá que haver um equilíbrio entre a flexibilidade exigida aos trabalhadores e às empresas e a reestruturação do sistema de protecção social de forma a garantir que a parte da segurança não seja relegada para segundo plano.

Estes princípios de acção que acabamos de enumerar constituem um importante desafio que todos nós devemos agarrar, participando desta forma na construção de uma sociedade mais justa e equitativa, mais próxima dos cidadãos e dos seus problemas. Importa, em nosso entender, criar os alicerces para a construção de um modelo social assente no respeito pelo outro, na valorização das suas capacidades e competências e na procura de um equilíbrio entre o desenvolvimento e o crescimento económico e a coesão social.

A actuação da REAPN tem sido no sentido de ver concretizados os referidos princípios.

Compromisso, participação, co-responsabilização, parceria e trabalho em rede, territorialidade, são palavras que devem cada vez mais estar presentes na definição de estratégias eficazes e efectivas de combate à pobreza. Importa caminhar na luta contra a pobreza e exclusão com um desígnio explícito: de que é possível atingir a meta da erradicação! A erradicação da pobreza e da exclusão social não é um mito, não é uma utopia, é um desafio e um desígnio que exige o compromisso de todos!
Fonte: Ecclesia

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